Os benefícios e riscos da IA estiveram presentes em diversos painéis no Web Summit Rio 2024. Do lado de fora do centro de convenções, entretanto, o avanço segue sem regulamentação.
Em entrevista para o jornal Valor Econômico S/A, a CEO e fundadora da Somos Newa, Carine Roos, lembra que a inteligência artificial está aí há anos, mas ela avançou muito mais rápido que qualquer regulamentação. Sua sugestão é fazer uma pausa para fazer uma avaliação sobre ética, governança e diversidade.
A segunda edição do Web Summit Rio, evento de inovação sediado na capital fluminense até quinta-feira (18), mostra que, em quase um ano desde que o Brasil estreou no circuito internacional da conferência, as aplicações da inteligência artificial (IA) generativa avançaram rapidamente, mas a regulação, nem tanto.
Neste ano, o evento que discute tecnologia, empreendedorismo, mudanças climáticas, diversidade, marketing, mídia, cultura e economia, espera reunir 30 mil pessoas no Riocentro, público superior aos 21,3 mil participantes do ano passado.
Os benefícios e riscos do avanço da IA estarão presentes em diversos painéis no Web Summit Rio 2024. Do lado de fora do centro de convenções, entretanto, o avanço segue sem regulamentação.
Na primeira edição do Web Summit Rio, no início de maio de 2023, o Congresso quase aprovou o Projeto de Lei 2.630/20, conhecido como PL das Redes Sociais, para que não haja disseminação de conteúdo falso em plataformas digitais. Desde então, o PL ficou parado no Congresso e agora deve passar por uma reformulação, conforme propôs o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP- AL), na semana passada.
Nesse intervalo, a IA avançou muito. Pode criar textos e imagens capazes de convencer eleitores do mundo todo, por meio de manipulação, em um ano de eleições em ao menos 64 países, incluindo o pleito municipal no Brasil.
“Este ano, vários países terão eleições, e a gente ainda tem uma janela de ‘desproteção’ em relação à regulação justamente no campo de disseminação de deep fake e de informações falsas”, alerta Carine Roos, fundadora da Newa, consultoria voltada a diversidade, equidade e inclusão, em entrevista ao Valor. “A inteligência artificial está aí há anos, mas ela avançou muito mais rápido do que qualquer regulação.”
Roos, que participa do painel “Como a geopolítica moldará a regulamentação da IA”, no dia 16 de abril, alerta para a necessidade de diminuir o ritmo do avanço da IA para uma avaliação sobre ética, governança e diversidade. “Teremos que fazer uma pausa e entender como construir isso de uma maneira diferente”, diz Roos. “A regulação não impede o crescimento. Só que a pausa é vista, no campo econômico, como um atraso, já que estamos numa corrida espacial [da IA].”
O ritmo da disputa entre Estados Unidos e China por quem domina a entrega de chips que sustentam o avanço da IA não dá sinal de pausa, mas sim mais munição à crise geopolítica entre os países. Recentemente, ambos anunciaram investimentos multimilionários em novas fábricas de microprocessadores.
No meio do caminho estão empresas como a Nvidia. A fabricante americana de unidades gráficas de processamento (GPUs, na sigla em inglês) está à frente na venda de poder computacional para suportar as aplicações de IA. A empresa fala sobre sua trajetória nesta terça-feira, no painel “Nvidia e a corrida dos chips para IA”, no palco central do Web Summit Rio.
Na visão de Roos, a concentração de poder dos EUA sobre a IA reforça vieses, falta de diversidade e eleva o risco de “colonização digital”. Para ela, isso ocorre tanto em plataformas quanto em infraestrutura, pela força do idioma e sua disseminação na programação de dados.
“O mundo é narrado sobre a ótica masculina, o que já se reflete nas redes sociais ou quando fazemos uma pesquisa simples”, nota Roos, que é mestre em Gênero pela London School of Economics and Political Science. “Agora, está se discutindo mais essa mudança, mas, ainda assim, massivamente, a internet é muito branca e muito masculina.”
Tentar maquiar a diversidade na internet, segundo Roos, é um caminho que já se mostrou errado. Em fevereiro, o Google precisou retirar o recurso de geração de imagens do Gemini, sua ferramenta de IA generativa, e se desculpar após o algoritmo ter gerado imagens de soldados da era nazista com diferentes origens étnicas. “Talvez o que a gente precise fazer seja dar um passo para trás e pensar como queremos desenvolver essa inteligência artificial”, sugere a especialista.
No entanto, para empresas de tecnologia, que investem bilhões de dólares na IA generativa, diminuir o ritmo significa dar espaço aos rivais. “A análise que não está sendo feita é a gente pensar numa solução a longo prazo que envolva a regulação, o entendimento do desenvolvimento e que vai tornar essa tecnologia mais efetiva e mais econômica, porque ela vai ser mais sustentável”, aconselha Roos. “Falta visão estratégica de longo prazo e sobre o que é melhor para as pessoas, não somente sobre o que é melhor para as empresas”.
Sobre Carine Roos
Mestre em Gênero pela London School of Economics and Political Science – LSE. Também é pós-graduada na Faculdade Israelista Albert Einstein em Cultivando Equilíbrio Emocional nas organizações e atua como especialista em Diversidade, Equidade e Inclusão há 10 anos. Lidera a Newa, empresa de impacto social que prepara organizações para um futuro mais inclusivo por meio de sensibilizações, workshops, treinamentos e consultoria de diversidade.
Reportagem publicada no Valor Econômico em 16 de abril de 2024