Carine Roos destaca que, apesar dos desafios significativos, a crescente presença feminina no campo da IA traz uma riqueza inestimável para o desenvolvimento do setor.
Na última década, a Inteligência Artificial (IA) tem proporcionado avanços em diversas esferas da ciência e da sociedade. Com o objetivo de desenvolver sistemas capazes de simular a inteligência humana, esses algoritmos incorporam as visões de mundo e as crenças de quem os desenvolve. Deste modo, o grande desafio é entender como as mulheres podem ser representadas por essa ferramenta se ela ainda é dominada pelos vieses inconscientes machistas presentes na sociedade. Carine Roos, Mestra em Gênero, especialista em Diversidade, Equidade e Inclusão há mais de uma década e CEO da Newa, destaca a importância de uma análise crítica sobre quem está desenvolvendo as soluções e como essas impactam os diferentes grupos para os quais são projetadas.
Frequentemente sub-representadas em cargos de liderança e supervisão, as mulheres muitas vezes ficam ausentes das decisões relacionadas à gestão algorítmica. Carine Roos aponta que “a automatização desse processo pode levar à fragmentação do trabalho, dividindo as tarefas em partes menores e altamente específicas. Isso cria um ambiente onde os trabalhadores têm pouca ou nenhuma compreensão do processo como um todo ou dos objetivos da empresa”.
Para as mulheres, esses impactos tendem a ser mais rigorosos, já que elas são frequentemente empurradas para ocupações que são mais propensas a serem controladas por algoritmos, e não participam da elaboração desta tecnologia. A especialista reforça que a gestão algorítmica nesses setores pode intensificar a precariedade ao implementar sistemas rigorosos de monitoramento e avaliação que desconsideram as complexidades dos cuidados pessoais e sociais.
“Esse tipo de condução pode ignorar ou subvalorizar o trabalho não remunerado que muitas mulheres realizam, como o cuidado doméstico, dos filhos, de idosos, de pessoas doentes ou serviços comunitários. Esse fator apenas reforça as desigualdades de gênero, já que as plataformas digitais, muitas vezes, não reconhecem ou recompensam adequadamente essas contribuições”, afirma Carine.
Em palestra no HackTown deste ano, um dos principais festivais de inovação, negócios, tecnologia e criatividade da América Latina, Carine explicou que a abordagem feminista na lA questiona as estruturas de poder existentes que influenciam o desenvolvimento e a implementação dessas soluções. Por isso, incluir mulheres e outras minorias na construção desse ecossistema é fundamental para que ele se torne cada vez mais inclusivo, afinal, segundo o relatório do Índice Global de Disparidade de Gênero, de junho de 2024, as mulheres representam apenas 28,2% da força de trabalho em STEM (Science, Technology, Engineering, and Math), em comparação com 47,3% em áreas não-STEM.
Para promover um espaço de inovação que atenda e considere as demandas desse grupo, ele precisa fazer parte da sua evolução. Uma forma de humanizar o trabalho nesse contexto de gestão algorítmica é garantir que os algoritmos sejam desenvolvidos com princípios éticos que considerem a dignidade humana, justiça e igualdade, mantendo elementos humanos na supervisão. “Ao adotar essas estratégias, as empresas podem amenizar os efeitos desumanizantes da gestão algorítmica e criar um ambiente mais justo e humano para todos os trabalhadores, com atenção especial às necessidades e desafios específicos enfrentados por nós”, finaliza Carine
Carine Roos é especialista em Diversidade, Equidade e Inclusão há 10 anos. Ela é CEO e fundadora da Newa Consultoria, uma empresa de impacto social que prepara organizações para um futuro mais inclusivo por meio de sensibilizações, workshops, treinamentos e consultoria de diversidade. Mais de 12 mil pessoas foram impactadas em vivências que somam aproximadamente 3 mil horas em salas de aula e cerca de 2 mil mulheres mentoradas, que hoje estão mais seguras, mais estratégicas, mais reconectadas com a sua história e com a sua essência. À frente da Newa, Carine tem como missão preparar líderes para que a diversidade e a inclusão sejam uma realidade imediata nas organizações.
Matéria publicada na Carta Capital em 15 de agosto de 2024.