Você se sente exausto? Saiba que você não está sozinho

De tanto ouvir sobre a palavra exaustão, o psicólogo, palestrante, colunista e escritor Alexandre Coimbra Amaral resolveu transformá-la em uma personagem semi ficcional e lançar o livro “A exaustão no topo da montanha” onde trata do tema com uma linguagem acessível a todos.

Quantas vezes você já ouviu as pessoas falarem: estou exausto da pandemia, de ficar em casa, de horas de reunião, dos afazeres domésticos, da pressão do trabalho? A palavra ficou tão repetitiva que fez com que o mestre em psicologia clínica e escritor Alexandre Coimbra Amaral começasse a estudar as origens, os autores, as características e escrever  um livro semi ficcional para tornar a linguagem da psicologia acessível a qualquer pessoa.

Palestrante corporativo que atua também como consultor de projetos de saúde mental em empresas, instituições de saúde e escolas, acaba de lançar o livro “A exaustão no topo da montanha” onde contextualiza a presença da exaustão em diversas formas de vida abordando temas como altruísmo a maternidade, trabalho, sucesso profissional e uma conectividade excessiva. 

Com recurso de linguagem, a exaustão se torna a protagonista fazendo dela uma personagem que tem uma história, uma narrativa, uma jornada, então o leitor acompanha a jornada da exaustão ao longo dos capítulos do livro mas não como uma vilã, mas como um possível impulso e uma oportunidade. Afinal, como transformar uma vida exausta? É possível experimentar um novo panorama mesmo diante de um fenômeno tão presente em nossos dias?

Alexandre é palestrante e ainda autor do best-seller Carta de um terapeuta para seus momentos de crise, colaborador do programa Encontro com Fátima Bernardes da Rede Globo, além de colunista da revista Crescer da Editora Globo, do portal Lunetas e do Jornal Valor Econômico. Conversamos com ele sobre seu novo trabalho.

Do que se trata o livro?

A Exaustão não é um livro sobre a pandemia. É um fenômeno e uma das características da vida do século 21, é uma forma de como estamos aprendendo a viver. Ela surge no momento que não temos mais pausa, o smartphone entra na nossa vida envolvendo público e privado levando a gente a um estado de alerta o tempo inteiro com notificações que conduzem a nossa vida. A exaustão nasce como essa personagem sem dar muito spoiler. Ela é uma senhora que mora no alto de uma montanha por onde sobem as pessoas de sucesso. E para chegar lá, precisam escalar, lutar e acabam exaustas. Queria mostrar este lado B. O que é que sente uma pessoa que chega lá para além de todos os aplausos dos reconhecimentos sociais? O que se perde e se ganha, porque não existe nada na vida que não seja ambivalente e então temos o direito de ver o outro lado.

Como você define a exaustão?

A exaustão é um produto dessa aceleração que estamos vivendo, é o que sai lá da alma moída por esta forma de vida e isso não tem a ver com faixa etária, com classe social, raça. É um guarda-chuva cultural que está pegando todo mundo. A exaustão ela dialoga com o CEO e com o motorista do Uber, com a mulher empreendedora e a empregada doméstica, porque esse discurso é assim: você não pode parar, tem que aproveitar o máximo seu tempo. Neste sentido, a produtividade do ser humano está a serviço de uma expressão de uma performance ligada o tempo inteiro. Faço essa metáfora: imagine um computador que você tem que manter ligado o tempo todo, em algum momento ele vai dar um bug, vai colapsar, queimar o fusível, isso é o que nós estamos fazendo com nosso corpo, cérebro, alma. A gente não está desligando. A gente não tem mais nem o prazer de fazer uma só tarefa. Virou multitarefas e ainda por cima simultâneas. Por exemplo, enquanto assisto uma série, respondo mensagem de WhatsApp, tiro uma foto da tela da televisão para postar no stories e assim vai.

Qual a diferença entre exaustão e descanso?

A exaustão não é algo que se resolva com o descanso, portanto ela não é sinônimo de cansaço. Ela é um sintoma de uma cultura de vida. Descansar alguns dias não resolve. Você vai voltar para o mesmo modo de funcionamento. Apenas vai tirar umas gotinhas da borda do copo para voltar a encher em uma semana. Não é para produzir melhor, o descanso é um direito humano. O descanso é parte da experiência da fruição da beleza da vida. Descansar é entrar em silêncios, contemplar a beleza da vida, porque existem coisas na vida, existem sabores e texturas da vida que eu só vou conseguir perceber se não estiver acelerado. Por exemplo, quando um pai leva a criança para escola, sai correndo andando pois tem de ir ao trabalho e o filho para para admirar formiguinhas fazendo a trilha com os pedacinhos de folhas e ficamos furiosos pois esta ação vai causar um atraso. Esta é uma cena perfeita do que significa este nosso momento sócio-histórico. Somos os que dizem para o tempo da delicadeza da criança: anda logo! E na verdade a criança está nos salvando nessa hora. Nos convidando a fazer poesia junto com ela aqui na vida cotidiana.

E entre exaustão e burnout?

A exaustão não se manifesta em um burnout. Posso inclusive passar uma vida inteira em exaustão sem essa falência do corpo. O burnout é aquela hora que o corpo fala assim: pronto agora você vai ter que cuidar disso. Os adiamentos não são mais possíveis. O seu corpo agora tem primazia de cuidado. Isto também já é um sintoma da nossa cultura que nós só conseguimos parar quando o corpo entra em estado de falência. 

Quais os sintomas do burnout?

O primeiro lugar é a sensação de culpa quando eu paro. Esse é o sintoma mais sério. 

Ela causa uma ansiedade de que estou perdendo o que eu não estou fazendo. Se você descansar, tem a sensação de perder grandes oportunidades. Eu não posso dizer nãos. A minha vida é uma vida de sims. Para eu dar um não eu preciso contar uma história trágica para a pessoa, pois do contrário ela vai me ver como uma pessoa relapsa, preguiçosa, pouco comprometida. 

Outro sintoma é o sono, tão fundamental na vida humana, e neste momento pode ser o  excesso de sono ou a falta dele. Ou rola aquele sono incontrolável às 3 horas da tarde no meio da reunião importante ou chega a noite e não consegue dormir tendo pensamentos  catastróficos.

O terceiro sintoma é ver a vida como se ela fosse um eterno check-list. Preciso ter uma agenda diária, semanal, mensal e transformar a vida nessa parametrização de ações que eu faço. Se não alcanço estes parâmetros, fica uma sensação de débito gerando mais ansiedade por desempenho, mais aceleração, mais desconexão com outro. 

Há solução para a exaustão?

Nós estamos muito adoecidos e não acho que o nosso caminho é nos adaptarmos a uma estrutura doente. Nosso caminho é nos juntarmos para construir saídas para esse adoecimento coletivo. Tivemos um aumento no Brasil de 40% em relação aos números que já eram estarrecedores de uso de medicação psiquiátrica no Brasil durante a pandemia. E se nós não olharmos para isso nós vamos pifar como sociedade e como sociedade produtiva que precisa continuar produzindo, que precisa continuar operando nesse mundo. Isso não é um avesso da necessidade produtiva. É um ajuste que precisa ser feito, a forma como nós estamos construindo os nossos afazeres, a forma como os dias estão se sucedendo nos ambientes laborais, a forma como nós estamos podendo ou não descansar dessas jornadas. A exaustão acontece com quem ama o seu ofício e não somente com quem tá em desalinho com seu trabalho. 

Ouça o primeiro episódio da terceira temporada do podcast “Somos Newa”.

Alexandre Coimbra Amaral é mestre em psicologia clínica, escritor e palestrante corporativo e atua também como consultor de projetos de saúde mental de empresas e instituições de saúde e escolas. Acaba de lançar o livro “A exaustão no topo da montanha”. É autor do best-seller “Carta de um terapeuta para seus momentos de crise”. Colaborador do programa Encontro com Fátima Bernardes da Rede Globo, além de colunista da revista Crescer, do portal Lunetas e do jornal Valor Econômico.