Como ter consciência de privilégios?

Você tem consciência dos seus privilégios?

A palavra vem do latim privilegium, que significa “direito para alguns”, hoje podendo ser encontrado nos dicionários de uma forma mais extensa: “substantivo masculino Vantagem (ou direito) atribuída a uma pessoa e/ou grupo de pessoas em detrimento dos demais; prerrogativa”; apanágio, regalia.

O privilégio é uma vantagem que nos parece naturalizada, sobre a qual nunca pensamos porque sempre contamos com ela, mas que faz uma falta aguda e pronunciada às pessoas que não dispõem dessa vantagem.

Em um artigo no site Papo de Homem, Alex Castro, relembra “que uma mulher cisgênero e heterossexual, por exemplo, não conta com várias “vantagens” masculinas que, para os homens, são tão naturais que nunca nem pensam nelas, como falar sem ser interrompida em uma reunião de negócios ou ter a temperatura do ambiente de trabalho sempre regulada para o seu conforto pessoal.

Por outro lado, do ponto de vista de pessoas trans* e homossexuais, essa mesma mulher dispõe de vários privilégios com os quais elas nem se dão conta, como usar o banheiro que representa a sua expressão de gênero e passear de mãos dadas nas ruas com a pessoa com quem tem um relacionamento amoroso.”

Muitas pessoas após perceberem os seus privilégios relatam um forte sentimento de culpa. Uma imensa culpa por seus privilégios, mas essa culpa não leva a nada.

Quando falamos sobre gordofobia, machismo, homofobia, racismo e privilégios, não é para ofender as pessoas ou se sentir culpadas. É pra reconhecer que existem pessoas que vivem opressões diárias e outras que usufruem de privilégios e que poderiam usar desses mesmos para ajudar quem não os têm (em muitos casos, nem direitos possuem).

Insistir em um sentimento de culpa pode levar à inércia. O que na verdade é imprescindível é parar para ouvir e reconhecer o privilégio que você possui. Aceitar que por mais incômodo que seja, vivemos numa sociedade desigual, mas não imutável e que, por isso, é importante se envolver e compreender.

A realidade está aí. Pesquisa PoderData mostra que 81% dos brasileiros dizem haver preconceito contra negros no Brasil por causa da cor da pele. Só para apenas 13% da população, o racismo não existe no país. Só que quando se pergunta “Você diria que tem preconceito contra pessoas negras?”. O resultado do levantamento mostra que 34% dos brasileiros afirmam que sim, consideram ter preconceito contra negros. É muito difícil admitir o racismo incutido em todos nós o que gera uma sensação falsa de democracia racial.

Vale mencionar como indicação o livro: o Pequeno Manual Antirracista da Djamila Ribeiro, onde ela fala que em uma sociedade racista não basta você ser contra o racismo, mas sim ser antirracista. Da mesma forma, em uma sociedade machista não basta ser contra o machismo, mas sim ser anti machista, não endossando piadas racistas, homofóbicas, gordofóbicas, capacitistas ou machistas.

Privilégio é sobre como a linha de partida na vida para alguns grupos está bem na frente de outros, a questão não é do mérito (até porque em uma sociedade cheia de desigualdades, não podemos acreditar na falácia da Meritocracia), mas o que nós, que possuímos privilégios, podemos fazer?

O primeiro passo para a mudança é a tomada de consciência. O Jogo do Privilégio, iniciativa do instituto Identidades do Brasil, é uma ferramenta que traz clareza através de exemplos claros do que é um privilégio. Coloquem no Google, existem vários vídeos com o exemplo, mas trouxemos aqui algumas perguntas utilizadas no jogo.

Treze pessoas foram convidadas a responder 50 perguntas. Dependendo da resposta, o participante andava para frente ou para trás. O resultado, como esperado, foi um só: na frente, pessoas de pele branca; no meio ou atrás, pessoas de pele negra. A conclusão, como diz uma das participantes, é que se essa fosse de fato uma corrida, os concorrentes não sairiam todos do mesmo lugar – como isso pode ser justo?

Veja alguns exemplos de perguntas do Jogo do Privilégio Branco

  1. Se sua família esteve presente em sua infância e adolescência, dê um passo adiante.
  2. Se ganhou mesada durante sua infância ou adolescência, dê um passo adiante.
  3. Se sua casa já encheu de água ou se já perdeu algum bem por morar em área de risco, dê um passo para trás.
  4. Se já estudou em uma instituição pública durante o ensino básico, fundamental ou médio, dê um passo para trás.
  5. Se você teve problemas em fazer amigos na escola ou arranjar emprego em função da sua raça, dê um passo para trás.
  6. Se já ouviu piadas por conta da cor da sua pele ou tipo de cabelo, dê um passo para trás.
  7. Se já desejou ter outra cor de pele, dê um passo para trás.
  8. Se você pode manifestar carinho e afeto pelo seu par romântico em público sem medo de represália, ridicularização ou violência, dê um passo para frente.
  9. Se foi diagnosticado por alguma deficiência física ou mental, dê um passo para trás.
  10. Se tem sua liberdade de ir e vir sem medo de sofrer abuso ou violência sexual, dê um passo pra frente.

Agora, faça as perguntas abaixo para você mesma e parta para a ação

  1. O que eu, mulheres cis, posso fazer com o meu privilégio para ajudar pessoas não-héteros?
  2. O que você, como branco, pode fazer com o seu privilégio para ajudar pessoas negras?
  3. O que você, como homem, pode fazer com o seu privilégio para ajudar as mulheres?
  4. O que você, como cis, pode fazer para ajudar pessoas trans utilizando seus privilégios?
  5. O que você, magro, pode fazer para contribuir numa sociedade cada vez menos exclusiva para com pessoas gordas?

Para aprofundar seu repertório, deixamos como indicação o documentário que estreou na Netflix em Setembro de 2019 Alô, privilégio? É a Chelsea. (Hello Privilege. It’s Me, Chelsea), dirigido pela realizadora e produtora negra Alex Stapleton e estrelado por Chelsea Handler, comediante branca estadunidense. O foco da obra é a discussão sobre o privilégio branco.